30/11/18

30/11/18

A morte e a morte de Quincas Berro D'Água - Jorge Amado

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Pode conter spoilers da obra, resenha destinada aos vestibulandos! 

A morte e a morte de Quincas Berro D'Água primeiramente foi escrito no intuito de um conto para a revista Senhor, porém com o tempo o gênero dessa obra foi denominada como uma novela. Não é preciso dizer que as obras de Jorge Amado tem respaldo em todo o mundo, e essa não fica de fora da fama, adaptada para minisséries, teatro, balés e até filmes, Quincas sobrevive até hoje no riso dos leitores e na cachaça das ladeiras de Salvador. 

Quincas teve duas vidas, como Joaquim Soares da Cunha, ele era um homem de família bem respeitado, exemplar funcionário, bom pai, "granfino", mas que vivia em completa tristeza e suportando tudo quieto. Até que um dia, Joaquim não aguenta mais viver essa vida de aparências, com uma mulher que aparentemente era uma jararaca (nas suas próprias palavras) e sai de casa para nunca mais voltar.

Surge então Quincas Berro D'Água, um dos maiores vagabundos da Bahia, o maior cachaceiro de Salvador, e provavelmente um dos homens mais felizes também, nessa nova vida, ele não devia satisfações a sociedade, não se importava com o que falavam sobre ele e muito menos se importava com as aparências que por muito tempo desolavam sua felicidade. 

E se ele pôde ter duas vidas, porque não ter duas mortes, ou ainda, pelo menos para minha interpretação, três mortes?

Para mim, a primeira morte, foi a de Joaquim, a morte social de um homem infeliz, já que sua família sempre inventava desculpas para o seu sumiço. A segunda morte, ocorreu em um quarto imundo, Quincas foi encontrado já morto em sua cama numa zona não tão valorizada de Salvador. Ao receber a notícia, sua filha Vanda sentiu-se aliviada, agora ela poderia limpar o nome da família, e resolveu dar pelo menos um digno enterro a ele. Contudo, enquanto Vanda nutria o sentimento de alívio, uma parte da cidade caía em prantos diante da morte de um homem tão amigo, companheiro, que ajudava a tantos quanto podia e que estava sempre a uma mão de apoio.
  
Então, seus melhores amigos, Pé-de-vento, Negro Pastinha, Curió e Cabo Martim resolveram ir ao seu velório, e o contraste entre a família de Quincas e seus amigos se torna claramente contrastante, ao serem deixados a sós, os amigos em um delírio alcoólico dão de beber ao morto e o leva pra noite da cidade, nesse momento, a gente fica sem saber se Quincas realmente está morto, pois existem falas, gestos e atitudes que instigam a dúvida no leitor, e nos fazem perguntar se tudo aquilo é real ou apenas uma alegre fantasia provocada pelo álcool. 

Enfim, chega a sua terceira morte, uma tempestade derruba seu corpo do barco em que estavam, e ele tem o fim que sempre desejou, se fosse para morrer, que fosse no mar, beijado pelas espumas das ondas e sentindo a paz que sempre quis para a sua vida.
  
Em poucas páginas, Jorge traz para o leitor toda a magia das noites de Salvador, mais uma vez me sinto encantada por ler a Bahia em um livro dele, nessa obra ele critica principalmente a estrutura clássica de família, a falsidade e a vida regada por aparências, com uma linguagem fácil e cheia de gírias e locuções baianas, ele conquista o leitor a cada linha.

26/11/18

26/11/18

As Meninas - Lygia Fagundes Telles

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“As Meninas” é um clássico da autora Lygia Fagundes Telles, primeiro livro que leio dela e já me encantei com sua escrita cheia de críticas, realidade e emoção.

Publicado em plena Ditadura militar, ainda me pergunto como ele passou pela censura, contudo a crítica ferrenha presente na narrativa é camuflada por metáforas, e extensas descrições e reflexões feitas pelas personagens, o que torna sua criticidade difícil de ser acessada por um leitor desatento.

Narrado por três meninas completamente diferentes uma da outra: Lia, Lorena e Ana Clara que vivem em um pensionato de freiras e estudam na USP, o livro nos faz flutuar por memórias, dramas, ideologias e sentimentos que fazem o mundo chorar e sentir a dor de cada uma delas.

Lia de Melo Schutz é uma militante contra a ditadura, estudante de ciências sociais da USP, filha de mãe baiana e pai alemão (ex-nazista), sua narrativa é composta de críticas ao sistema vigente, além do medo e da constante insegurança de ser descoberta e presa, talvez a mais forte das três, ela deixa transparecer determinação e certeza sobre o que pensa. Lia é uma mulher desprovida de qualquer vaidade e com pensamentos típicos de uma observadora social, já que ela se preocupa com grupos que sofrem e não se iluda com coisas supérfluas.

Lorena de Vaz Leme é quase o contrário de Lia, vaidosa, riquíssima e alheia a realidade em que vive, uma típica burguesa, ela representa o consumismo desenfreado e acredita piamente na religião, utilizando conceitos e reflexões religiosas para compor sua narrativa.

Poliglota, estudante de Direito, Lorena mostra ao longo da obra sua emotividade em relação a tudo a sua volta o que contrasta bastante do perfil do seu curso, mas no final do livro veremos o quão fria e calculista ela pode ser, com sua rotina na concha rosa (seu quarto), ela constitui a base financeira das outras duas meninas, pois com sua riqueza infindável sustenta necessidades e vícios delas. Acompanhada pela sombra de ter visto um irmão matar o outro em uma brincadeira, ela sofre com a memória e a ausência da mãe em sua vida, além de viver na ilusão que constrói para si mesma.

Ana Clara Conceição é a mais difícil de acompanhar, viciada em drogas, amedrontada desde pequena por um estupro, sua narração é sem sentido e cheia de pontuações fora do lugar, o que achei incrível por parte da autora, que utilizou esse artificio para mostrar o quão à personagem estava fora da lucidez.

Filha de prostituta, ela com certeza foi a que mais sofreu e em parte podemos compreender o porquê de sua entrega as drogas, seu curso é psicologia, e reflito se ela gostaria de estudar essa matéria para entender o mundo que tanto a molestou, ou a si mesma, porém o mantem trancado.

Max, seu namorado, é traficante, o que denota a facilidade com que ela tem acesso a drogas.  Seus devaneios e alucinações voltam sempre ao tema de sua infância, ao um futuro que ela tanto deseja e mostra o quanto ela é a voz da marginalidade social.

A leitura desse livro é sensacional, os personagens não são totalmente bons ou ruins, heróis ou vilões, o que mostra quanto Lygia quis explorar a complexidade da natureza humana, as diversas facetas e dramas existentes em cada protagonista, seus sonhos e sentimentos, além de encantar o leitor com a fluida de sua escrita.

Tratando sobre questões sociais bastante importantes, como o preconceito racial, o consumismo e homossexualidade, “As Meninas” se torna praticamente uma leitura obrigatória daqueles que não deixam a poeira da intolerância cegar a essência do respeito e do amor ao próximo. Não vejo a hora de ler seus outros livros, porque esse com certeza entra pra minha lista de favoritos da vida!

18/11/18

18/11/18

A Prisão do Rei - Victoria Aveyard

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Para quem não leu a série ainda, NÃO LEIAM A RESENHA, PODE CONTER SPOILER, já que é o terceiro livro da saga.
  
Após ser capturada por Maven, Mare Barrow passa seus dias presa no castelo, sofrendo humilhações, raiva e inconstantes fatos o tempo inteiro, a personalidade bipolar do novo rei é altamente imprevisível e a garota elétrica tenta ao máximo lidar com cada mudança de humor e atitude dele, claro nunca dando o braço a torcer e sempre maquinando uma rota de fuga daquele pesadelo chamado pedras silenciosas que impedem o uso do seu poder.
  
Enquanto isso, a Guarda Escarlate se torna cada vez mais forte, aliando-se a personagens nunca esperados e mostrando facetas antes nunca mostradas, todo lado tem duas caras, e com os rebeldes não é diferente, ao mesmo tempo que muitos lutam pela derrubada das desigualdades entre vermelhos e prateados, alguns usam os ideais da rebelião para conquistar poder e alcançar interesses políticos. Enfim a guerra que começa ideologicamente, parte para o confronto corpo a corpo que me arrepiou na narração tanto de Mare, quanto de Cal e Evangeline.
   
Ta aí uma personagem que nunca achei que fosse admirar ou ainda que se destacaria tanto, Evangeline toma um rumo diferente nesse terceiro livro, surpreendendo em suas colocações e aprendendo com a dor a ser uma pessoa um pouquinho melhor,e trazendo uma surpresa bastante agradável para a saga mas que não posso dar spoiler! 

Seguindo a tendência de seus livros, A prisão do rei é maior que A rainha vermelha e também que Espada de vidro, contudo a leitura não e demorada devido aos acontecimentos excitantes em toda a obra, quando não temos guerra e ação, Victoria dá aos seus leitores tramas e intrigas de encher o prato. Esperando ansiosamente por Tempestade de guerra, e do jeito que A prisão do rei terminou, MDS, vem muito fight por aí!

Não deixe de conhecer as histórias:



08/11/18

08/11/18

Todos contra todos: O ódio nosso de cada dia - Leandro Karnal

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Dizia Thomas Hobbes: a espécie é a luta de todos contra todos. E é com essa temática que começamos a tratar do assunto central desta singela e grande obra do historiador e filósofo Leandro Karnal, o ódio.

Vivemos num país pacífico de desastres naturais, afinal não temos terremotos, tsunamis, e estamos de certa forma favorecidos no meio da estabilidade de uma placa tectônica, mas vivemos como dizia Nelson Rodrigues o cordialismo exacerbado transparecendo cada vez mais o ódio nosso de cada dia.

Neste exemplar, Karnal nos traz uma visão sistêmica e um choque de realidade de como a ideia de sermos pacifista é ilusória e de como isso vem camuflado dentro da história.

Somos o país que mais mata no trânsito, nunca tivemos uma guerra civil desde o descobrimento; a escravidão terminou com uma princesa e uma pena, numa tarde ensolarada em 1888; mas na verdade sempre vivemos com o racismo, o genocídio e a segregação social.

O mais difícil de aceitar é como isso se tornou tão natural e como a realidade não mais nos incomoda. Nosso ódio incrustado revela mais sobre nós mesmo do que o objeto odiado.

Reclamamos da corrupção na política, mas esquecemos desses mesmos preceitos a furar uma fila no aeroporto, quando não recebemos o troco errado.

Trazendo uma série de exemplos cotidianos e argumentos de tirarem o fôlego o escritor nos propõe uma saída para compreensão destes problemas instaurados no coração e no fomento de uma união de força entre o elemento protetivo a leve reclamação para formação de respeito cada vez mais constante de seu papel na sociedade.


A leitura deste livro é uma excelente oportunidade de extrair um tema muito importante dos centros universitários para os debates cotidianos como forma de transformar a percepção e o ambiente em que vive, motivo pelo qual, transformou o escritor num dos palestrantes mais requisitados da atualidade.


Ótimo ponto de partida para uma reflexão mais estruturada!