03/04/19

03/04/19

Essa Terra - Antônio Torres

| |

Esse livro é bastante cobrado em vestibulares no Brasil todo, portanto pretendo trazer uma resenha detalhada que pode conter spoilers. Antes de começar a resenha, gostaria de informar a vocês alguns fatos literários sobre a obra: É uma recriação da vida do próprio autor, logo é um livro autobiográfico, dividido em 4 partes, "Essa terra me chama", "Essa terra me enxota", "Essa terra me enlouquece", "Essa terra me ama", que revelam a ambiguidade dos sentimentos do narrador pela terra natal e sua primeira publicação foi feita em 1976. 

Confesso para vocês que a leitura foi um pouco complicada para mim, pois a obra é um relato bem fragmentado e não linear do protagonista Totonhim que descreve através de suas emoções os trágicos acontecimentos em sua família, tendo sempre como ponto principal os impactos do êxodo rural sobre os personagens e os destrinchamentos de tal processo sobre a pacata vida dos moradores de Junco, uma cidadezinha no interior da Bahia. 

Nelo, irmão do protagonista, foi o primeiro da família a ir para a Grande São Paulo, e a narrativa muitas vezes roda em torno das dificuldades passadas por ele e no efeito do seu suicídio ao retornar para sua cidade natal, o que nos revela a grande ilusão que é pensar na migração como solução e melhora de vida, até porque é sabido o grande preconceito que os nordestinos sofrem na região sudeste até os dias atuais, e para Nelo a fuga de seus problemas foi a morte. 

Se vocês acham que a desgraça da família acaba ai, estão muito enganados. A família ainda tem que lidar com a loucura da mãe, a pobreza e as dívidas que só crescem, as fugas dos filhos na vã esperança de encontrar uma vida melhor, a solidão do patriarca em criar 3 filhos pequenos sem dinheiro e ainda a decisão de Totonhim de seguir os passos de Nelo rumo a São Paulo. 

Diferentemente da maioria dos romances regionalistas, "Essa Terra" trata a seca como um problema secundário, sendo o "roubo" dos jovens - mão de obra - do sertão pelo sul-sudeste o maior demônio, já que muitos vão e nenhum volta. Com isso percebemos uma certa revolta por parte do autor, que vê as desigualdades regionais como um elemento tóxico ao desenvolvimento humano e social do país. 

Quanto aos personagens e à linguagem utilizada pelo autor, não há nada surreal, é possível enxergar as pessoas envolvidas na história pois elas fazem parte do cotidiano de qualquer pessoa que more no Nordeste, quem nunca teve contato com um senhor altamente religioso, ou com um cara que vive bêbado, ou ainda com uma família que vive da agricultura de subsistência, e até com as tão típicas beatas do sertão? As falas e narrações distanciam-se das exageradas expressões sertanejas, sendo colocados vocabulários e linguajares de uma forma muito natural que eu quase não percebi a existência deles já que eu mesma uso muitos. 

Apesar de ter achado complicado, o livro traz uma mala cheia de histórias, fatos e reflexões que nos fazem olhar o retirante por uma nova perspectiva, com certeza foi uma obra que me tirou da minha zona de conforto, o que venho fazendo desde 2018 e está sendo uma experiência indescritível!

Sem comentários:

Enviar um comentário